domingo, 30 de outubro de 2011

O COLETIVO

"Qual é a definição de insanidade? É fazer sempre a mesma coisa e esperar um resultado diferente. E se for esse o padrão, a maioria de nós não é são. Mas não ao mesmo tempo. E, baseado nisso, nós confiamos. Mas esse meio de vida resiste se mais e mais pessoas forem insanas ao mesmo tempo. Torna-se como Gordon disse: sistêmico. Como câncer.


O que acontece, então?

Como eu disse, a mãe de todas as bolhas foi a explosão cambriana. E aconteceu por acaso a mais de 500.000.000 de anos.

Os cientistas dirão que foi sem precedentes, que aconteceu num estalo de dedos. E disso, de repente, o mundo tinha milhões de novas espécies. E daí nós nascemos. A raça humana. Agora, nesse sentido, as bolhas são evolutivas. Elas matam o excesso, reúnem o rebanho, mas nunca morrem, apenas voltam em formas diferentes. Quando explodem, dão à luz um novo dia. Sempre gerando mudanças. "

Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme
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Recentemente fiz uma apresentação sobre organização de jogo, e algumas coisas que envolvem isso na minha concepção de futebol e ao final fui questionado sobre o que achava dos treinos coletivos.

Minha resposta foi basicamente esta:

Desde que seja um coletivo com critérios, podemos fazer.

Pois vou explicar o que seria isso. Existe aqui no Brasil uma tendência ao "coletivo", que é para muitos o mais especifico dos treinos, pois é o que retrata melhor o jogo. De fato, em algumas metodologias isso é verdade, como por exemplo, na metodologia convencional.

Em treinos integrados o coletivo deixa de ser tão "especifico" quanto é para o treino convencional, pois neste existem treinos em espaço reduzido que promovem junto com a especificidade técnica e tática (quando solicitada no exercício, porém normalmente esta dimensão, nesta metodologia e neste tipo de exercício não é levada em conta, sendo a separação das equipes normalmente feita de forma grupal, sem preocupações setoriais ou intersetoriais).

Algumas características do coletivo convencional:

- 11 contra 11;- Tempos longos retratando o tempo real de jogo (2x35, 2x40, 2x45 - 1x45, 1x50, 1x60 minutos);
- Regra normal de jogo, tanto em bola rolando quanto em bola parada;
- Espaço de campo total;
- Número de toques na bola liberado;
- Titulares x Reservas;

Estes são alguns pontos mais valorizados nos coletivos clássicos. Estes traços são de fato o retrato do "jogo oficial", pois o coletivo tem essa idéia mesmo, jogar como se irá jogar no jogo, e os jogadores pelo menos nas culturas que tive contato têm uma grande necessidade de realizar estes coletivos semanalmente. É como se fosse um teste semanal para eles, uma avaliação para sentir o seu modo atual de jogo, seu rendimento, e para o treinador o coletivo convencional passa a ser um tipo de feedback da equipe na semana.

O problema no caso do coletivo abordado acima esta relacionado a algumas consequências que surgem neste tipo de treino, e estão situados nas seguintes variáveis:

- Propensão a algo;
- Acumulação de fadiga de jogo;
- Baixa qualidade;
- Baixa Intensidade;

PROPENSÃO A ALGO:

Metodologicamente o princípio das propensões nos possibilita contextualizar o exercício para solicitar o aparecimento de determinadas coisas mais do que outras, ou seja, estar mais propício a algo. O jogo, em geral é de fato uma forma de avaliação qualitativa e até quantitativa sobre o aparecimento destas coisas, que através da propensão levamos aos treinos e treinamos.

Portanto existe uma lógica em fazer coletivos para tentar perceber se esta ou não acontecendo estes comportamentos idealizados pelo treinador. O problema é que o coletivo tradicional pelo seu tempo de duração, pelos seus confrontos em níveis muito desiguais, e pela contextualização não idêntica à competição (pois o lado emocional, a torcida, o stress não estão tão presentes) acabam sendo um pouco "enganadores".

Enganam, pois dentro da exigência baseada nestes elementos o jogador consegue sucesso sem a necessidade de na maioria das vezes estar no seu limite máximo de desempenho, o que acaba gerando uma estabilização, muitas vezes influenciada pela fadiga, que é gerada pelo excesso de tempo do coletivo e pela oposição de menor qualidade sem exigência de competição.

Outro detalhe é a participação, que se reduz muito pela relação com o espaço de jogo, que neste caso tende a solicitar pouco do jogador.

ACUMULAÇÃO DE FADIGA DE JOGO(S):

Este é outro ponto chave, a acumulação de fadiga que acontece através da não total recuperação do jogo anterior, em conjunto com a realização deste coletivo, mesmo que este seja colocado num dia em que possivelmente tenha ocorrido a total recuperação geral do organismo dos jogadores (+ ou - dependendo da individualidade do atleta em termos de recuperação). Ou seja, até mesmo para quem respeita os 4 dias de recuperação para jogar um novo jogo, a utilização deste tipo de coletivo pode ser prejudicial pela necessidade de recuperação para o próximo jogo, que se feito por exemplo na quinta-feira, terá apenas sexta e sábado, para voltar a jogar domingo, isso em uma semana completa de treinos, sendo que por jogarem longos tempos continuamente, mesmo que em menor intensidade, a tendência é uma depleção energética muscular e hepática elevada, além de grande possibilidade de acumulo de micro-rupturas pela quantidade de tempo de solicitação, que irá influenciar o próximo treino em termos de qualidade e intensidade assim como o treino seguinte e provavelmente deixará resíduos elevados de fadiga para o próximo jogo.

O mais interessante é o ciclo que se passa a partir daí, pois demonstrando sinais de cansaço, inclusive precoce, o jogador que é avaliado em meio ao coletivo qualitativamente, ou por colocar para a comissão técnica o seu cansaço, é submetido depois a mais treinos físicos, para melhorar sua suposta condição física, sendo que na verdade o que lhe falta é exatamente descansos passivos, e mais treinos de recuperação talvez para poder voltar a seu estado de supercompensação digamos ou estado de exaltação para uma nova solicitação de qualidade.
 
Sendo que ainda estou sendo otimista na colocação do dito coletivo na quinta-feira, o pior é quando ele ocorre na sexta-feira, dia em que se está bem perto do próximo jogo, ou na terça-feira, dia em que se esta bem perto do último jogo, e nos dois casos a fadiga certamente estará se acumulando no organismo da equipe.

AS LESÕES:

O cansaço adquirido por este tipo de treino normalmente leva a lesões no final de diferentes gravidades, bem como frequentes discussões, brigas, e outros distúrbios causados, normalmente no fim do treino, pela baixa recuperação que acontece neste tipo de solicitação.

Minha experiência empírica me mostra que normalmente as lesões de treino ocorrem exatamente nos coletivos, e com grande tendência aos 15 minutos finais, exatamente pela mistura de fadiga e discussões, daí surgem muitas torções de tornozelo, tostões pelo timing errado de entrada no lance e até mesmo rupturas ligamentares.

BAIXA QUALIDADE E INTENSIDADE:

Neste tipo de treino, à qualidade tende a ser menor primeiro pelos confrontos, que muitas vezes são marcados por titulares x reservas (principalmente em equipes que buscam definir isso bem), o que proporciona aos titulares, que normalmente possuem maior qualidade, principalmente em clubes de baixa faixa aquisitiva, uma certa despreocupação, uma baixa intensidade até, que querendo ou não, ajuda a habituar o corpo a este tipo de esforço mais contínuo e de baixo nível competitivo (algumas equipes até o fazem sem o uso de caneleiras, com agressividade baixa, o que na competição oficial não ocorre), que se torna mais agravante por ser contínuo com maior dominância aeróbia, mais do que o jogo oficial, que terá que obrigatoriamente ser no máximo, e este máximo terá que ser em dominância anaerónia alática e até lática, por mais que em um contexto contínuo e consequentemente também aeróbio.

Portanto eu acredito que esta solicitação sub-máxima (sendo otimista) de longa duração não ajuda na manutenção da qualidade, mesmo que o treinador faça intervenções em alguns momentos, metabolicamente o treino tende a baixar demais o rendimento na parte final. Isso explica o motivo de algumas equipes levarem tantos gols neste momento do jogo.

Frente a estes detalhes, o coletivo que parece se for feito com estas intenções e e construção, tende à ser um pouco contra producente para a equipe, tanto "na hora" quanto "no acumulo" de fadiga que ajuda a elevar.

Portanto vou colocar uma situação diferente, em termos de coletivo. Vejamos:

Alguns objetivos:

-Criar situação de jogo em Coletivo 11x11;
-Treinar determinados princípios e assuntos tratados em menor complexidade na semana (antes), em situação mais complexa;
- Evitar a fadiga acumulada através das pausas;
- Manter a hidratação da equipe;
- Manter à qualidade através de orientações e ajustes nas pausas;

Início normal, 11 contra 11, em um treino de uma hora e meia, ou 1:45 por exemplo (isso é variável de acordo com categorias e competições):

Após aquecimento (+ou- 15 minutos) e objetivos propostos inicia-se o coletivo:


Ao fim de 10/15 minutos, acontece a primeira pausa. Nesta valoriza-se intervenções relacionadas aos objetivos que foram propostos nos primeiros 15 minutos, isso depende de cada situação, de cada equipe.

Após isso, cerca de 2 ou 3 minutos, inicia-se um exercício diferente:, podendo valorizar os mesmos objetivos, ou podendo modificá-los, abaixo um exemplo:

Situação de 11 contra 1 - Tiro de meta adversário. Neste exercício cada equipe realiza a situação em um dos lados do campo, gerando determinados comportamentos e conclusões, previamente propostas pelo treinador.
Após 3 à 5 minutos, inicia-se a segunda parte do coletivo, em jogo formal novamente, podendo sofrer ou não mudanças nos objetivos, e até mesmo nas regras do coletivo, como por exemplo o jogo em dois toques.

10/15/20 minutos depois, pausa-se novamente o coletivo. Hidratação e inicio a mais um exercício, que pode seguir a mesma linha do primeiro, ou modificar, depende do que se busca para o dia. Abaixo coloquei um exercício que valoriza a zona pressionante, em que o adversário fica estático, porém aberto no campo, de forma posicional, e os jogadores da outra equipe buscam uma pressão com o bloco todo de acordo com o jogador com bola, pressionando, fechando linhas e compactando de acordo com a recepção da bola.


Manutenção do bloco de acordo com a posição da bola.


+ou- 5 minutos depois se inicia o terceiro tempo de coletivo, onde se pode objetivar os princípios treinados no exercício anterior, tendo mais ou menos a ver com o que já foi solicitado ou não, isso vai de cada contexto.

15 minutos após, pausa-se novamente o coletivo, e ai pode-se fazer um novo exercício, ou somente repor energia com repositores hidro-eletrolíticos, ou somente entrar em orientação e intervenção do treinador, bem como alongamentos, porém, com algum tempo de recuperação e reorganização.

15 minutos mais de jogo, e termina-se o coletivo, ao total com dois tempos de 30 minutos, mais 20 minutos de recuperação com exercícios, hidratação, orientação ou alongamentos.

Vale salientar que o tempo não é fixo, e é interessante seguir uma pontualidade no que diz respeito a totalidade do treino, portanto o tempo final pode ser menor ou maior, depende do que aconteceu antes, do que foi exigido antes, tentando fechar dentro do previsto, ou até mesmo antes, mas não depois.

Grande abraço.
Luis Esteves
la_futeboll@hotmail.com

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