quinta-feira, 6 de setembro de 2012

BRUCE LEE E FUTEBOL

"Esvazie a sua mente, não tenha forma, seja moldável como a água.
Se você coloca a água em uma xícara,  se transforma na xícara.
Se você coloca água em uma garrafa, se transforma na garrafa.
Se coloca em um bule, se transforma em um bule.
A água pode fluir, ou pode amassar.
Seja como a água meu amigo."
 
Bruce Lee



Recentemente em uma conversa, tive a indicação deste vídeo através do professor Mauro Rocha, atual coordenador técnico do Fragata FC, clube da cidade de Pelotas, onde resido atualmente.

Trata-se de uma entrevista de Pierre Berton com Bruce Lee. Vou dispensar qualquer tipo de apresentação ao mesmo, pois acredito não ser necessário tamanha importância que teve na história através das artes marciais.

Pois bem, separei algumas frases que o mesmo coloca em meio a entrevista, frases estas que me levaram a algumas reflexões, porém sob a ótica do jogo de futebol, tentei ao retira-las do vídeo, não deixa-las descontextualizadas, ou até mesmo tendenciosas.
 
 
 

PRIMEIRA REFLEXÃO:

"Bruce Lee: Mas as artes marciais tem um significado muito, muito profundo. Até o ponto que afetam minha vida, porque como ator, como artista marcial, como ser humano tudo o que sei aprendi com as artes marciais.

Pierre Berton: Você montou uma escola em Hollywood, não? Para gente como James Gardner, Steve Macqueen e os demais.

Bruce Lee: Sim.

Pierre Berton: Porque querer aprender arte marcial chinesa, por um papel?

Bruce Lee: Na realidade não. Muitos deles... ou ao menos, na forma como ensino... todo o conhecimento conduz ao final, ao conhecimento de sí mesmo. Portanto as pessoas acudem a mim para que já lhes ensine, não a se defender, ou dar surras em alguém, e sim o que querem e expressar-se através do movimento. Seja fúria, determinação, ou o que quisermos. Assim que, o que digo, em outras palavras, é que me pagam para que lhes ensine, através do combate, a arte de expressar-se com o corpo humano.

Pierre Berton: O que é interpretar até certo ponto não?

Bruce Lee: Bom...

Pierre Berton: Ou seria uma boa ferramenta para um ator...

Pode soar muito filosófico, mas é um não atuar atuando, ou um atuar não atuando... se você...

Pierre Berton: Me perdi.

Bruce Lee: Sim? O que estou dizendo em realidade, é que, é como uma combinação de ambos. Por um lado esta o instinto natural, e por outro o controle. Tem que combinar-se em harmonia. Se você se inclina ao extremo você é muito pouco científico.

Se você se inclina ao outro, se transforma em um autômato... deixará de ser um ser humano. Se trata de combinar bem as duas coisas. Portanto não se trata de ser puramente natural, nem de ser puramente desnatural. O ideal é uma naturalidade desnatural, ou uma desnaturalidade natural,

Pierre Berton: O Ying e Yang?

Bruce Lee: Exato. Isso.
 
REFLEXÃO
 
Aqui trago para o futebol o seguinte:
 
COMO NOS EXPRESSAMOS:
 
Devido a algumas leituras que fiz sobre José Mourinho, e assuntos relacionados, fui percebendo a importância da modelação jogador-equipe, equipe-jogador, jogador-treinador, treinador-jogador, treinador-equipe, equipe-treinador, dentre outras variáveis de relações. Modelação esta que normalmente segue uma via de apenas um sentido: Treinador-jogador ou Treinador-equipe.
 
A algum tempo a palavras "contextualizar" vem sendo utilizada com certa frequência, como sinônimo de bom senso. De fato, contextualizar é importante demais, porém mais do que isso, "identificar" se torna tão ou mais importante, pois nos permite distinguir o que e como iremos contextualizar coisas.
 
Identificar o que existe, e o que emerge da junção das coisas que existem no ambiente da equipe. A partir daí, surge um determinado contexto, baseado na interferência maior ou menor das coisas que ali estão.
 
Também é necessária a identificação dos jogadores que temos, e isso vale para qualquer nível. Dentro da disponibilização destes, teremos que perceber o que cada um tem a dar para a equipe, e que benefícios e malefícios cada um, em relação aos outros jogadores e aos conceitos do treinador, irão gerar.
 
Saliento isso pois muitas vezes vi uma modelação equipe-jogador, quase feita mecanicamente, como se todos pudessem jogar da mesma forma. E isso é anti-natural. Náo é saudável gerar essa linha de expressão, onde todos tem os mesmos comportamentos. Os comportamentos devem sim seguir uma lógica coletiva, mas situados especialmente pelas caracteristicas individuais.

Muitas vezes tentamos "adaptar" determinado jogador em determinada função, retirando ou modificando a forma como ele se expressa no jogo, e isso significa variabilidade. Ou seja, cada um faz, muito bem o que sabe, e a equipe, sabe o que cada um faz muito bem. O que faz mal, a equipe esconde.

Desta forma damos liberdade para que o jogador possa se expressar de forma original, porém lógico que dentro de uma dinâmica coletiva. Esta dinâmica deve ser adaptada aos traços que o jogador apresenta. Este princípio é fundamental para a boa produção do jogador.
 
A IMPORTÂNCIA DO EQUILÍBRIO
 
Esta parte me lembrou a nossa tendência ao extremismo, baseada na nossa escolha de estilo, modelo, linha de pensamento, muitas vezes gerando um desequilíbrio. Este desequilíbrio irá gerar, normalmente, uma realidade irreal do jogo. Os sintomas são muitos:  mecanismos mecânicos, incapacidade de produzir o que foi treinado, não identificação do que foi treinado, dentre outros.
 
Bruce Lee cita o Instinto e o Controle como dois extremos de algo que deve se manter em constante equilíbrio, porém não um equilíbrio estático, e sim um equilíbrio em constante evolução, ou seja, pelo treino, o equilíbrio exigido hoje, será diferente de amanha, terá que ser cada vez mais um equilíbrio específico.
 
O Instinto natural podemos trazer para o lado da individualidade do jogador, seus traços em diferentes dimensões, e o Controle, seriam os limites conceituais do treinador para gerar uma mesma sintonia de ideias a nível coletivo.
 

SEGUNDA REFLEXÃO:

"Bruce Lee: É que, em realidade não ensino Karatê pois já não acredito em estilos. Quero dizer, não acho que exista um estilo chinês de luta, ou um estilo japonês de luta... ou qualquer outro tipo de estilo de luta... porquê teriam que existir humanos com três braços, ou quatro pernas para que existisse outro estilo distinto de luta.

Todos nós temos duas mãos e dois pés. Os Estilos tendem a separar as pessoas, pois cada um tem sua própria doutrina, e essa doutrina se converte em uma verdade inquestionável que não se pode alterar.

Se não tem um estilo se diz: Aqui estou em, como ser humano, como posso expressar-me plena e completamente?

Dessa forma não se cria um estilo, pois o estilo é cristalização. Dessa forma se entra em um processo de crescimento contínuo."
 
REFLEXÃO
 
A NECESSIDADE E A CRISTALIZAÇÃO DE ESTILOS
 
Aqui novamente me lembrei de José Mourinho, e sua capacidade de adaptação. José venceu em todas as ligas que participou, e cada jogo que propôs, a nível macro, também se diferenciou bastante.
 
O que quero dizer é que, a cristalização de um modelo acaba por nos tornar uma ferramenta fixa, ou seja, quando precisarmos de soluções diferentes, não conseguiremos, pois nosso estilo irá limitar nosso raio de decisões.
 
Por isso faz sentido o entendimento de diferentes caminhos para chegar ao sucesso no jogo, embora paradoxalmente não possamos estar toda hora modificando a nossa forma de jogar, temos que reconhecer que todos os jogos são diferentes, logo irão necessitar de soluções diferentes.
 
TERCEIRA REFLEXÃO:
 
"Bruce Lee: Para mim arte marcial consiste em expressar a mim mesmo honestamente. E isso é muito difícil.
 
Para mim seria muito fácil montar um espetáculo e presumir, inundar-me dessa sensação e me fazer de durão e tudo isso. Ou poderia fazer toda a classe de coisas falsas, entende o que quero dizer? E deslumbrar com elas, fazer movimentos muito floridos, expressar-se com toda a sinceridade, isso meu amigo, é muito difícil de fazer. E você tem que treinar.
 
Tem que manter seus reflexos em forma para que quando queira, já esteja ai! Quando quiser mover-se, você se move e quando faz isso, o faz com decisão. Não uma polegada para o lado mais ou menos."
 
REFLEXÃO
A IMPORTÂNCIA DA AUTENTICIDADE, SER HONESTO CONSIGO MESMO

Aqui vejo o problema da modelação do jogador a uma forma de jogar que não possibilite uma liberdade de expressão. É muito comum o jogador fazer o que o treinador "manda", pois precisa jogar. Jogar significa aparecer, estar na mídia, ter oportunidade, jogar contra possíveis interessados no futuro, elevar contratos, elevar estilo de vida, ajudar família, enfim, uma série de elementos rondam o "querer" jogar.
 
Portando o jogador se submete a uma mudança de caracteristica para poder jogar, e nesse momento acaba sendo desonesto consigo mesmo. Embora a adaptação deva ocorrem em via dupla, ela não pode acontecer a tal ponto do jogador perder a identidade e se transformar em outro jogador.


ENTREVISTA



Grande abraço
Luis Esteves
la_futeboll@hotmail.com